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"O Consumador da Fé", Abraham Hunter |
O livro de Eclesiastes, segundo a imensa massa de comentários judeus e cristãos antigos, fora escrito no final da vida de Salomão, quando este, já no final da vida, olha para trás e tenta transmitir a um (ou vários) discípulos não simplesmente o propósito da vida, mas a utilidade das coisas que usamos para viver. Aparentemente, tudo o que Eclesiastes vê é “vaidade”, a vida humana repleta de coisas vãs, como nuvens passageiras, sem sentido, sendo determinada. Como disse J. I. Packer, por “ciclos periódicos na natureza que parecem não ter propósito”. Todavia, Packer prossegue nos dizendo que o que o Eclesiastes quer é que vejamos as dificuldades e aparente futilidade da vida sem nossos óculos cor-de-rosa, sem nosso achismo de achar que estamos no “centro de comando” de nossas vidas, entendo todos os propósitos de Deus e discernindo o tempo inteiro como sua mão providencial age. Quando nos despojamos de tais pretensões, começamos a enxergar mais claramente e começamos a aprender como viver, sendo que Salomão começa a dar vários conselhos práticos para isso.
Dentre os conselhos que ele aponta, importa destacar o que está presente no capítulo 7.10:
“Nunca digas: Por que foram os dias passados melhores do que estes? Porque não provém da sabedoria esta pergunta”.
Não devemos entender Salomão erroneamente aqui. É claro que há coisas boas e virtuosas que existiam tempos atrás e que experimentamos em nossas vidas e que a geração presente parece desconhecer (ainda que esquecer virtudes e boas ações são esquecidas não é uma característica única dessa geração). Mesmo na igreja por vezes devemos orar e desejar para que aquilo que Deus fez no passado por seu povo se repita hoje (Hc 3.1-19). Salomão não é contra a nostalgia, a busca por virtudes esquecidas e muito menos pelo clamor por avivamento. O que Salomão se coloca contra é a tolice de um coração murmurador e amargurado, que de maneira ingrata, por vezes atenta para um passado idealizado (por melhor que fosse, também teve sua poção de angústia e males para lidar), que se esquece que o Deus que agiu naquela época é o mesmo Deus que age em favor de seus filhos hoje. O qual deu boas dádivas para seus filhos ontem é o mesmo que dá boas dádivas para seus filhos hoje, pois Deus é o mesmo ontem, hoje e será para sempre.
Quantas expectativas, sonhos e projetos foram feitos para 2020 e quanto disso se realizou? Ainda que saibamos de certa forma essa reposta, devemos também, como crentes em Jesus Cristo, termos os olhos abertos para todas as bênçãos e livramentos que o Senhor nos concedeu durante esse ano. Pois só assim teremos condições de orarmos e prestar sábio auxílio para aqueles que experimentaram tantas tragédias este ano, mostrando que, mesmo em meio a tudo, Deus é Santo e Bom, nosso socorro bem presente na hora da angústia e que nos consola mesmo em meio ao vale da sombra e da morte.
No fim, diante de todos as coisas e aparentes ciclos absurdos da vida, há um Deus que é bom e conduz todos as coisas para o bem daqueles que pertencem a Ele (Rm 8.28). Vivamos para a glória de Deus hoje, sem esquecermos do que ele fez no passado por nós, mas com a santa alegria e esperança em Jesus Cristo, sabendo que ele fará por nós no futuro. O poema de Adam Clarke parafraseia lindamente o que Salomão expressou:
“Espere o Resultado, não questionando com ira desgovernada
Porque Deus permite certas coisas. Seus caminhos, ainda que agora
Envoltos em nuvens e trevas, aparecerão certamente
Quando de teus olhos a névoa se dissipar
Até lá, para aprenderes mais submissão à sua vontade
mais sabedoria mostras, do que vãs tentativas
de explorar o que não podes compreender,
e Deus por sábia finalidade, pensou por certo esconder”.
Clarke entendeu que quando estamos com Deus, melhor é o “final das coisas, que o começo delas” (Ec 7.8).
O blog Servorum Dei deseja a todos os seus leitores um abençoado Ano Novo no Senhor Jesus Cristo.
Feliz Ano Novo!
Soli Deo Gloria