segunda-feira, janeiro 22, 2018

O Culto de Narciso


Narciso na primavera, Jan Ross.

As marcas da era digital são indeléveis. Seja no dia a dia familiar, sejam nas atividades da igreja, é impossível fugir da influência da tecnologia em nosso modo de pensar e agir. Por estarmos acostumados com as principais potencialidades da internet, por vezes, parece-nos impossível deixar de lado o nosso eu virtual. Podemos, inclusive, cair no erro de agir como se este fosse o nosso verdadeiro eu.

É claro que demonstrações de carinho e afeto não surgiram em nossos tempos. No entanto, a necessidade de realizar tais provas de amor em público é sentimento peculiar de nossa geração. Escrever os chamados “textões” no Facebook parece nos dar mais prazer do que produzir uma carta. Quer assumamos ou não, mesmo que a pessoa à qual nos dirigimos leia nossas declarações em ambos os casos, nossas afirmações públicas têm gosto especial: a de sermos reconhecidos por outros. Na loucura de nossos tempos, somos capazes de tornar nossos momentos mais íntimos e especiais em meios para a autoexibição.

Infelizmente, é possível transformar um simples “eu te amo, mãe” em meio para receber um soberbo “nossa, como ele é filho exemplar”, ou um tolo “esta família que a gente respeita”. Para vergonha nossa, somos capazes até mesmo de mascarar algum passeio comum (não tão legal e emocionante) com os amigos através de legendas repletas de “#MelhoresAmigos#PasseioTop”. Afinal, na era das redes sociais, nossa imagem e reputação parecem ser tudo.

A relação entre o homem e a paixão pela autoexibição não é tema recente. Por exemplo, na mitologia grega, somos apresentados ao mito de Narciso. Segundo escreve Thomas Bulfinch:

[…] Ali chegou um dia Narciso, fatigado da caça, e sentindo muito calor e muita sede. Debruçou-se para desalterar-se, viu a própria imagem refletida na fonte e pensou que fosse algum belo espírito das águas que ali vivesse. Ficou olhando com admiração para os olhos brilhantes, para os cabelos anelados como os de Baco ou de Apolo, o rosto oval, o pescoço de Marfim, os lábios entreabertos e o aspecto saudável e animado do conjunto. Apaixonou-se por si mesmo. Baixou os lábios, para dar um beijo e mergulhou os braços na água para abraçar a bela imagem. Esta fugiu com o contato, mas voltou um momento depois, renovando a fascinação. Narciso não pôde mais conter-se. Esqueceu-se de todo da ideia de alimento ou repouso, enquanto se debruçava sobre a fonte, para contemplar a própria imagem.”[1]

Neste mito, a paixão de Narciso por si mesmo o leva à morte. Decerto este é o clímax da narrativa. Porém, é interessante observar o aspecto gradual da autodestruição deste personagem. Primeiro, Narciso esquece-se de necessidades legítimas, tais como comer, beber e descansar. Segundo, o personagem mitológico utiliza o restante das energias dele para contemplar a nova paixão: a própria imagem. Então, Narciso, fascinado por si mesmo, morre esgotado.

Tal fascínio narcisista quer se estabelecer em nossa geração. É muito fácil crianças e adolescentes isolarem-se com a companhia apenas de um aparelho com acesso à internet. Ficar sozinho no quarto, fazendo inúmeras selfies, a fim de postar alguma foto bonita na rede é comportamento recorrente em nossos dias. Este estilo de vida é tão comum que muitos pais nem sequer incomodam-se com ele. Paira sobre eles a ideia de que “a vida do século XXI é assim mesmo.”

Porém, as práticas narcisistas não se restringem às interações familiares e sociais. Não importa onde estivermos, nosso coração propenso à autoexibição estará conosco. Por isso, até mesmo a interação humana mais importante está sob ataque: a nossa relação com o santo Deus.

Neste contexto, devemos lembrar-nos de que atividades como evangelismo, auxílio aos mais necessitados e oração privada são ações recomendadas pela Palavra de Deus. Tudo isso é bem-vindo se for realizado dentro do que é prescrito pelo Senhor. Assim, qual o padrão que o Senhor Jesus estabelece para nossas obras? Vejamos:

Guardai-vos de fazer a vossa esmola diante dos homens, para serdes vistos por eles; aliás, não tereis galardão junto de vosso Pai, que está nos céus. Quando, pois, deres esmola, não faças tocar trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Mas, quando tu deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita; para que a tua esmola seja dada em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, ele mesmo te recompensará publicamente. E, quando orares, não sejas como os hipócritas; pois se comprazem em orar em pé nas sinagogas, e às esquinas das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Mas tu, quando orares, entra no teu aposento e, fechando a tua porta, ora a teu Pai que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará publicamente” (Mateus 6.1-6).

O padrão bíblico para as ações do povo de Deus, portanto, é a discrição. Tal virtude envolve humildade. Porque, quando se é discreto, Deus é o foco dos pensamentos e ações. No entanto, por meio de uma simples foto publicada na internet, o nosso serviço a Deus pode ser inteiramente desperdiçado e nossa recompensa reduzida à mera glória humana. Tratando acerca disto, Tony Reinke escreve:

A agitação de aprovação social tem condicionado que alimentemo-nos de ‘pequenas explosões de confirmação dadas através de cada curtida, marcação como favorito, retweet, ou compartilhamento’.[2] Este novo condicionamento fisiológico significa que nossas vidas tornam-se mais dependentes da aprovação dos outros a cada momento. O problema não é apenas que precisamos nos afastar destas pequenas explosões de aprovação, mas que devemos nos reprogramar desta fome on-line.

Caso não nos desintoxiquemos destes hábitos, continuaremos procurando intimidade reproduzindo nossa própria imagem, embebedando-nos da aprovação humana e iniciando cada dia com ressaca desta. E então precisaremos do antídoto de nova afirmação por parte de nossos amigos a fim de nos mantermos convencidos de que nossas vidas têm sentido. Isto é trágico. É recompensa desperdiçada. O louvor sólido que esperamos da parte de Deus é baseado em ações que, em grande medida, não são vistas agora; o louvor caprichoso que buscamos on-line é baseado no que exibimos.[3] Não podemos negligenciar este contraste.”[4]

O alerta de Tony Reinke é muito sério, pois ele enfatiza o ensino de Jesus acerca de quem exibe-se aos outros: “Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão”. Assim, estamos diante de uma escolha simples. Ou agimos discretamente a fim de receber a recompensa eterna que vem de Deus, ou agimos de modo a exibir nossas boas obras com o intuito de recebermos a recompensa temporária da parte dos homens.

Diariamente, precisamos nos lembrar disso. Seja a jovem mãe que precisa parar de expor o filho todo dia, apenas para receber uma dose de “nossa, amiga, como ele é lindo#presentedeDeus!” Ou o pastor que não consegue passar uma semana sem postar foto do rascunho dos sermões, para mostrar que ele leva a sério a pregação fiel da Bíblia. E o que dizer do pregador que ama ver a imagem dele nas redes? O objetivo não é a edificação do povo de Deus, e sim a da própria soberba. Lembremo-nos de que até mesmo um pedido de oração semanal pode ter más intenções. O que seria para pedir a bênção de Deus sobre o culto, pode, na verdade, manifestar a necessidade de consumo de porção de reconhecimento por parte dos outros.

Precisamos combater este impulso à autoexibição com todas as nossas forças. Nossas obras têm consequências eternas. Não podemos brincar com elas. Além disso, o culto ao Deus verdadeiro está em jogo. Se o objetivo de nossas ações, inclusive as ditas “religiosas”[5], for a criação de belo álbum no Facebook e a aquisição de mais seguidores no Instagram por meio da autoexibição, Deus não será cultuado. Na verdade, se nossa imagem for o foco de nosso culto, realizaremos uma das piores formas de idolatria: a idolatria do eu, travestida de adoração ao Deus verdadeiro.

Que Deus nos livre disso.

Notas:

[1] Thomas Bulfinch, em O livro de ouro da mitologia: histórias de deuses e heróis, Agir, 2014, p. 108.

[2] Alastair Roberts, compartilhado com permissão (citação original em [4]).

[3] Rm 2.28-29 (citação original em [4]).

[4] Tony Reinke, em 12 Ways Your Phone is Changing You (12 Maneiras em que Seu Telefone está Mudando Você), Crossway, 2017, p. 76.

[5] O pensamento de que nossa vida é dividida em secular e sagrado é muito comum. A parte “secular” compreenderia as nossas atividades “não religiosas”, tais como emprego, estudos, diversão. O “sagrado”, por sua vez, seria constituído do que “fazemos para Deus”, como orar, ler a Bíblia, ir à igreja. Porém, na verdade, somos chamados a viver em todas as áreas de nossa vida para a glória de Deus. Assim, não há como consagrarmos a Deus apenas algumas de nossas ações ou partes específicas do nosso tempo. Tudo deve ser santificado ao Senhor. Então, devemos tomar cuidado com a idolatria do eu inclusive nas atividades que realizamos fora do contexto eclesiástico.

sábado, janeiro 06, 2018

A carta aos Hebreus e a autoria Paulina - (subsídio lições Bíblicas 2018)

Nesse primeiro trimestre de 2018 estudaremos a Carta aos Hebreus e a primeira lição, como de
praxe, faz um estudo introdutório da carta. Um desses elementos se refere a autoria da epístola.  A pergunta "quem escreveu Hebreus?" até hoje reverbera em um momento ou outro no debate teológico. A erudição teológica, de maneira geral, afirma atualmente certo agnosticismo com relação à autoria da Carta. Talvez a única certeza que a maioria dos teólogos afirmem é que certamente tal epístola não provém do apóstolo Paulo.

De maneira interessante, não era esse o consenso de grande parte da igreja no período patrístico, nem tampouco o consenso universal da cristandade a paritr de 400 d.C. De maneira geral, a igreja defendeu vigorosamente a autoria paulina da Espístola aos Hebreus. Quais os motivos para tal quebra de consenso? É possível ainda defender a autoria Paulina? É o que veremos a seguir.


- A Igreja Primtiva e Hebreus:

As primeiras citações de Hebreus provêm bem cedo na história da igreja. A Epístola de Clemente de Roma aos Coríntios é recheada da fraseologia e dos temas teológicos de Hebreus. No lado oriental da Cristandade, de fala grega, a epístola é contada como paulina, ainda que o estilo divergisse do estilo de Paulo. Segundo Pateno e Clemente de Alexandria, o autor da Epístola seria o apóstolo Paulo, porém o estenográfo (redator) da carta seria outro (Clemente de Alexandria sugere que foi Lucas que atuou como o redator). Um dos mais antigos manuscritos gregos do Novo Testamento, o papiro 66(século III depois de Cristo), coloca Hebreus logo após Romanos. A frase de Orígenes, registrada por Eusébio de Cesaréia em sua História Eclesiástica, é muito usada para sustentar um desconhecimento da autoria da carta: "Quem escreveu a carta, só Deus sabe". Todavia, um exame mais minucioso da frase mostra que Orígenes defendeu a autoria paulina:

 "Mas eu diria que os pensamentos são do apóstolo [Paulo], mas o discurso e a fraseologia pertencem a alguém que registrou que disse o apóstolo, e anotou livremente o que o seu mestre dizia... mas só Deus sabe quem realmente escreveu a epístola...de acordo com alguns, que Clemente, que era bispo de Roma, escreveu a epístola; de acordo com outros, que foi escrita por Lucas, que escreveu o Evangelho e os Atos"¹.

Fica claro, a partir do contexto, que Orígenes não atribui unicamente à onisciência divina quem é o autor da epístola, mas sim seu redator. Uma prova cabal que Orígenes cria na autoria paulina da espítola provém de sua declaração em sua magnum opus, Contra Celso. Neste livro, ao refutar o filósofo pagão Celso, Orígenes declara:

"Pois está escrito na carta de nosso Paulo aos Coríntios, gregos, cujos costumes ainda não tinham sido purificados: 'Dei-vos a beber leite, não alimento sólido, pois não o podíeis suportar. Mas nem mesmo agora podeis, visto que ainda sois carnais. Com efeito, se há entre vós invejas e rixas, não sois carnais e não vos comportais de maneira meramente humana' ( 1 Co 3,2-3). E este mesmo apóstolo, sabendo que certas verdades são o alimento da alma adiantada na perfeição, e outras, dos neófitos, são comparáveis ao leite das criancinhas, declara: 'Precisais de leite, e não de alimento sólido. De fato, quem ainda se amamenta não pode degustar a doutrina da Justiça, pois é criancinha! Os adultos porém, que pelo hábito possuem o senso moral exercitado para dicernir o bem e o mal, recebem o alimento sólido' (Hb 5,12-14)" (Contra Celso 3.53).²


Ainda que na igreja do ocidente houvessem dúvidas no que tange a autoria³, tais dúvidas se dissiparam devido a ampla aceitação da Epístola em várias igrejas, e por fim a aceitação que a Epístola provinha do apóstolo Paulo.

- A Opinião contemporânea acerca da autoria de Hebreus e a evidência interna:

A maioria dos estudiosos, em especial a partir do século XVIII e e XIX, começaram a lançar dúvidas acerca da autoria paulina de Hebreus. Dentre as maiores objeções, há as seguintes:

1. A ausência da tradicional identificação paulina, contida em todas as outras epístolas.
2. O estilo literário da epístola, que divergia em muito em termos do estilo Paulino.
3. A evidência que o autor na verdade não participara do círculo apostólico (Hb 2.3).

A primeira objeção, ainda que válida, pode ser explicada de várias maneiras. Uma possível explicação se daria pelo fato de aqui, Paulo não estar escrevendo para uma igreja gentítilica ou predominamente gentílica, mas sim para uma das igrejas mais primitivas do cristianismo: uma igreja judaica. Aqui, Paulo não precisa reforçar sua imagem como apóstolo, pois ao que tudo indica, todos os ouvintes sabiam quem ele era (Hb 13.22). Aqui, Paulo fala como "hebreu de hebreus", seu estilo fugiria do convencional, pois não se trata simplesmente de uma epístola, mas sim de uma palavra de exortação (gr. του λογου της παρακλησεως Hb. 13.22).  Em Atos 13.15, Lucas relata que Paulo e Barnabé entram em uma sinagoga e são convidados a dar uma "palavra de consolação" (λογος εν υμιν παρακλησεως), quem profere a palavra, aqui, é Paulo. O contexto hebraico da carta aos hebreus e sua natureza homilética só reforçam a autoria paulina.

A segunda objeção, bastante válida, tem ganhado, todavia, objeções de peso  através do trabalho de David Alan Black, professor de grego do Southeastern Baptist Theological Seminary e através da teóloga alemã Eta Linnemann. Em seu livreto monumental The Authorship of Hebrews - The Case for Paul (A autoria de Hebreus - Em defesa de Paulo). Black traça vários paralelos de expressões gregas encontradas em Hebreus e nas cartas paulinas, indo até mesmo a temas teológicos. De maneira semelhante, o artigo científico de Eta Linnemann, A Case for a Retrial of the Epistle of Hebrews (Um caso de Reanálise da epistola aos Hebreus), mostra claramente evidências linguísticas que estão de acordo com a linguagem paulina.

Mesmo um exame comparativo com a tradução em português é possível captar semelhanças temáticas e às vezes linguísticas entre o Paulo e Hebreus. Dentre as quais destacamos a seguir:

E eu, irmãos, não vos pude falar como a espirituais, mas como a carnais, como a meninos em Cristo. Com leite vos criei, e não com carne, porque ainda não podíeis, nem tampouco ainda agora podeis. (1 Co 3.1-2)

Porque, devendo já ser mestres pelo tempo, ainda necessitais de que se vos torne a ensinar quais sejam os primeiros rudimentos das palavras de Deus; e vos haveis feito tais que necessitais de leite, e não de sólido mantimento. Porque qualquer que ainda se alimenta de leite não está experimentado na palavra da justiça, porque é menino. Mas o mantimento sólido é para os perfeitos, os quais, em razão do costume, têm os sentidos exercitados para discernir tanto o bem como o mal. (Hb 5.12-14).

Porque tenho para mim, que Deus a nós, apóstolos, nos pôs por últimos, como condenados à morte; pois somos feitos espetáculo ao mundo, aos anjos, e aos homens. (1 Co 4.9)

Em parte fostes feitos espetáculo com vitupérios e tribulações, e em parte fostes participantes com os que assim foram tratados. (Hb 10.33)

Como tenho por justo sentir isto de vós todos, porque vos retenho em meu coração, pois todos vós fostes participantes da minha graça, tanto nas minhas prisões como na minha defesa e confirmação do evangelho (Fp 1.7).

Porque também vos compadecestes das minhas prisões, e com alegria permitistes o roubo dos vossos bens, sabendo que em vós mesmos tendes nos céus uma possessão melhor e permanente (Hb 10.34).

Se for possível, quanto depender de vós, tende paz com todos os homens (Rm 12.18)

Segui a paz com todos, e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor (Hb 12.14).

Depois desse comparativo, o leitor é covidado a fazer um comparativo do epílogo de Hebreus com os demais epílogos das outras cartas paulinas.  O epílogo tem forte sabor paulino:

Orai por nós, porque confiamos que temos boa consciência, como aqueles que em tudo querem portar-se honestamente. E rogo-vos com instância que assim o façais, para que eu mais depressa vos seja restituído. Ora, o Deus de paz, que pelo sangue da aliança eterna tornou a trazer dos mortos a nosso Senhor Jesus Cristo, grande pastor das ovelhas, Vos aperfeiçoe em toda a boa obra, para fazerdes a sua vontade, operando em vós o que perante ele é agradável por Cristo Jesus, ao qual seja glória para todo o sempre. Amém. Rogo-vos, porém, irmãos, que suporteis a palavra desta exortação; porque abreviadamente vos escrevi. Sabei que já está solto o irmão Timóteo, com o qual, se ele vier depressa, vos verei. Saudai a todos os vossos chefes e a todos os santos. Os da Itália vos saúdam.
A graça seja com todos vós. Amém.

Por último, resta a objeção levantada com base em Hebreus 2.3: "Como escaparemos nós, se não atentarmos para uma tão grande salvação, a qual, começando a ser anunciada pelo Senhor, foi-nos depois confirmada pelos que a ouviram".

A objeção é levantada pelo fato do autor parecer pertencer a segunda geração de discípulos. Todavia, é importante ressaltar aqui é que o autor não afirma ter recebido a revelação dos apóstolos, mas sim a confirmação por parte dos apóstolos. Ora, isso está totalmente de acordo com o que sabemos de Paulo.

Confrontando a opinião corrente, Eta Linnemann dá sua explicação de Hebreus 2.3:

"A segunda metade de Hebreus 2.3 está em aposição com o conceito de 'grande salavação'. Dessa 'grande salvação' eles obtém confirmação. A 'grande salvação' é o sujeito, não o 'nós', no qual o autor da epístola se coloca juntamente. Ocorre unicamaente com relação à salvação. Não siginifica aqui 'ensinar' ou 'fazer discípulos', mas 'estabelecer', 'confirmar', 'garantir'. Porque os mais jovens ouviram a proclamação de grande salvação do Senhor confirmada, eles são o 'nós' pela qual foi garantinda, não seus pupilos.Hebreus 2.3 certamente exclui o autor de ser inequivocadamente um jovem seguidor de Jesus de ser o autor de Hebreus, mas não o apóstolo Paulo, que nunca foi um inequívoco jovem seguidor de Jesus! O que se lê aqui então não entra em contradição com o que lemos em Gálatas 1.16-17)".

Conclusão

Apesar de hoje majoritariamente a autoria paulina ser descartada, ela não ficou todavia, sem defensores de peso na atualidade. Os argumentos levantados por David Alan Black e Eta Linnemann são fortes o bastante para ao menos se considerar o apóstolo Paulo como o mais provável candidato à autoria da carta, se não provam, realmente, que o apóstolo dos Gentios, certamente é o autor da epístola. Certamente que optar pela defsa da autoria paulina, terá como aliado o peso da grande tradição cristã. Tradição essa, que como Black e Linnemann mostram, tem muito a nos dizer.

Soli Deo Gloria.

Notas:

1. CESARÉIA, Eusebio de. História Eclesiásica. Tr. Lucy Iamakami. Rio de Janeiro: CPAD, 2004.p. 227.
2. ALEXANDRIA, Orígenes de. Contra Celso. Tr. Orlando dos Reis.2° ed. São Paulo: Paulus,2011. p.251
3. A igreja no ocidente aceitou de maneira definitiva o testemunho paulino de Hebreus através dos escritos de agostinho e Jerônimo. Na época da reforma, tanto Lutero quanto Calvino discordavam da autoria paulina de Hebreus. Lutero sugeriu Apolo como o mais provável candidato. Todavia, é de se estranhar que a igreja em Alexandria, de onde Apolo provinha, nunca sugeriu ter sido ele o seu autor.