sexta-feira, junho 15, 2018

Entre Calvinismo e Arminianismo Assembleiano: A questão da CPAD


Em tempos de Copa do Mundo, a  última coisa que pensei em escrever seria sobre a polêmica envolvendo o calvinismo e arminianismo no meio assembleiano-pentecostal. Porém, como em um artigo anterior eu  disse que voltaria a explorar esse assunto, a época atual se mostra propícia para tal. Mais uma vez, diga-se de passagem, a figura do pastor Altair Germano encabeça um vigoroso ataque contra a publicação de obras calvinistas na Casa Publicadora da Assembleia de Deus (CPAD). Dessa vez o alvo para o chumbo quente de Altair não é ninguém menos que Charles Spurgeon. Sim, caro leitor, lestes bem: o alvo agora é o considerado o maior pregador do Cristianismo (depois de João Crisóstomo): Charles Spurgeon.

Recentemente a CPAD publicou aquela que é considerada a Magnum Opus de Spurgeon: "Tesouros de Davi", um extenso comentário sobre o livro dos Salmos, voltados para a aplicação prática, pregação e devocional. Tal obra, inédita em língua portuguesa, deveria certamente ser considerada um marco editorial para a Casa Publicadora, porém Altair não poupou críticas a tal publicação, pois a considera  uma erva daninha às Assembleias de Deus no Brasil, herdeira da tradição teológica de Jacó Armínio (um nome desconhecido para uma grande maioria de assembleianos, até recentemente). Em um post em seu perfil do Facebook, o pastor Altair dispara: "O próprio Charles Spurgeon, autor da obra, chegou a declarar que o deus dos arminianos (nós assembleianos somos soteriologicamente armínio-wesleyanos) não era, nem nunca seria o seu Deus...". De fato, como é comum na vida de pregadores, Spurgeon disse coisas aqui e ali que sem dúvida provocariam (e de fato provocaram) controvérsias. Spurgeon começou sua vida de pregador saindo da adolescência, assumindo uma considerável igreja no início de seus vinte anos.  No início de seu ministério, Spurgeon proferira fortes ataques contra os arminianos e exaltação do calvinismo. Todavia, esse não é o quadro absoluto da história. Como nos conta Iain Murray, em sua obra Spurgeon versus Hipercavinismo: A batalha pelo verdadeiro evangelho(PES)  que com o passar do anos Spurgeon "deixou grandemente  de lado a prática de chamar outros cristãos de 'hipercalvinistas' ou de 'arminianos'. Os termos podem não ser depreciativos, porém nas controvérsias eles logo começam a carregar esse sentido e dessa forma podem alienar os cristãos a quem são aplicados..." e acrescenta " Spurgeon, como todos os filhos dos homens, tinha que aprender humildade, e ele nem sempre esteve isento de culpa com relação a isto em seus primeiros anos, mas lhe foi dado ver que um sistema que procurava atribuir tudo à graça de Deus tinha confiança demais nos poderes da razão". Ao analisar tais declarações, devemos lembrar que em debates polêmicos, muitos arminianos também não estão isentos de afirmações descabidas e exageradas.

Quando se analisa a exclusão sectária de qualquer obra de cunho não-aminiano da CPAD, não serão somente obras de presbiterianos e batistas rígidos que serão excluídas, mas boa parte do catálogo da Casa, dentre tais obras se incluem os livros de Norman Geisler ("tomista" evangélico- Batista) e também:

-"Mártires do Coliseu", de A. J. O'Reilly (Sacerdote Católico),

- "O Peregrino", de John Bunyan (Batista),

- "O Treinamento dos Doze", de A. B. Bruce (Presbiteriano calvinista, mais tarde liberal),

- "História dos Hebreus", de Flávio Josefo (Judeu - traduzido pelo padre Vicente Pedroso).

- "Os Pais da Igreja", de Hans Von Campehausen (neo-ortodoxo?),

- "História de Israel", de Eugene H. Merril (Batista Calvinista),

 - "História eclesiástica" de Eusébio de Cesaréia (católico oriental),

 - "Quem é você para julgar?" de Erwin Lutzer (Batista Calvinista).

Como se pode notar, tal lista abrange obras clássicas que beneficiaram toda a igreja brasileira no decorrer dos anos (a despeito da posição teológica ou até mesmo heterodoxia em alguns casos). Retirar tais obras do catálogo da casa é insensatez e presunção editorial. Quando uma editora se concentra em produzir apenas um tipo de literatura , é de se esperar que o sucesso seja "explosivo" no início,  porém com o passar dos anos, a produção venha a ter considerável queda e então a editora deve partir para uma renovação. Editoras como a Reflexão e Carisma podem sofrer desse mal daqui a alguns anos.

Com relação a publicação de obras calvinistas pela CPAD e sobre o calvinismo no meio assembleiano já escrevi com mais detalhes  em artigos anteriores (acesse clicando aqui e aqui), porém digo e repito: O problema que se enfrenta hoje nas Assembleias de Deus não é o calvinismo, mas sim três fatores: analfabetismo bíblico (incluindo a doutrina pentecostal), legalismo e política eclesiástica. Enquanto tais fatores prevalecerem, tal denominação começa a andar em círculos, quer seja calvinista, quer arminiana. Isso é algo que obreiros assembleianos, calvinistas ou arminianos, precisam atentar.


Soli Deo Gloria

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