sexta-feira, setembro 05, 2008

A Queda do Receptus: A História do Texto Moderno(Ensaios Sobre Crítica Textual parte 2)


Como foi relatado na primeira parte deste tema, a crítica textual pode ser perigosa para o texto bíblico e não somente a Alta Crítica, que desmerece boa parte do sobrenatural dos fatos bíblicos, mas a também chamada baixa crítica textual, que põe em cheque boa parte da autoridade bíblica em alguns trechos do texto sagrado.
A baixa crítica é formada em sua maioria por críticos do texto bíblico tradicional, editado na época da reforma por Erasmo de Rotterdan( levemente modificado em suas outras edições, feitas por ele próprio, Teodoro Beza os irmão Elzevir e Robert Stephanus), preferindo um texto mais "moderno" baseado, segundo eles, em manuscritos mais antigos e confiáveis do texto bíblico. Antes de adentramos sobre a qualidade interna destes manuscritos, cabe avaliar sua história e de como o atual texto moderno predomina na preferência da crítica textual do Novo Testamento.
Do século XVI ao século XIX e início do XX o Textus Receptus(Texto Recebido), formado pela Majoritária gama de manuscritos bíblicos em grego existentes até então, oriundos da cidade de Bizâncio, era considerado o texto definitivo do Novo testamento, haja vista que ele reuniu definitivamente em um só volume o conteúdo dos manuscritos bíblicos até então. O Texto Recebido também recebeu o nome de Texto Majoritário(não utiliza mais esse nome por razões que veremos mais adiante) e Texto Bizantino(Antioquia).
No decorrer dos tempos a crítica textual foi mudando consideravelmente, influenciando também a manuscritologia bíblica*, além do liberalismo teológico que começou a varrer a Europa no século XVIII. No século XIX, de forma surpreendente, dois manuscritos gregos até então desconhecidos são altamente popularizados por dois sacerdotes anglicanos, Brooke Fess Westcott e John Anthony Hort.
As origens desses manuscritos são motivos de polêmicas no meio textual, e ainda mais polêmica e estranha foi a história de suas descobertas. O primeiro texto a ser descoberto, foi o manuscrito conhecido como Aleph, foi encontrado pelo explorador de textos antigos Constantin Tischendorf, em visita ao mosteiro de Santa Cantarina, no monte Sinai. Ao se deparar com alguns manuscritos que seriam utilizados para acender o fogão do mosteiro, Constantin os retirou e atentou para seu conteúdo, que incluía O Pastor, de Hermas ( antigo documento patrístico), a Septuaginta, a Epístola de Barnabé e um Novo Testamento completo. Tischendorf ainda tentou negociar os manuscritos com o monges, mas eles recusaram-se vendê-lo, permitindo que Constantin apenas copiasse uma página. Depois de alguns anos, ele conseguiu finalmente o manuscrito, onde o levou para a Rússia, e posteriormente, a Alemanha, copiando seu material e o publicando em quatro volumes. No mosteiro que Tischendorf encontrou o manuscrito,certos detalhes de sua aparência certamente incomodam. O relato, a seguir, veio de R. L. Hymers, teólogo batista:

"Eu me tornei convicto da superioridade do Texto Recebido durante uma viagem à Península do Sinai, no verão de 1987. Minha esposa e eu éramos parte de uma expedição que escalou o Monte Sinai. Depois que descemos, visitamos o Monastério Santa Catarina, que se localiza ao pé da montanha. Eu fiquei chocado com as características estranhas e mesmo satânicas deste monastério. As caveiras de monges de todos os séculos estavam amontoadas em um grande aposento. Esta montanha de caveiras tinha entre uns 2,10 a 2,40m de altura. O esqueleto de um dos monges estava acorrentado a uma porta adjacente a esta pilha de caveiras, deixado lá como um guarda de idade indeterminável. Dentro do próprio santuário do monastério, ovos de avestruzes pendiam do forro, lâmpadas tenuamente iluminavam a atmosfera tenebrosa, e estranhos desenhos e pinturas contrárias às Escrituras decoravam o edifício inteiro. "Fomos guiados através deste fantasmagórico convento para o local onde os rolos Sinaiticus tinham sido guardados através dos séculos, por estes monges, até serem descobertos por Tischendorf, levados à [Rússia, publicados na] Alemanha, e finalmente vendidos à Grã Bretanha. Enquanto eu estava de pé em frente à caixa onde o manuscrito Sinaiticus tinha sido guardado antes de ser roubado por Tischendorf, eu tive a distinta impressão de que nenhuma luz espiritual poderia vir deste local..."

Outro detalhe importante: Os monges do mosteiro iriam queimar o manuscrito, não atribuindo a ele nenhum valor especial.
Constantin também conseguiu, de forma semelhante ao Sinaiticus, acesso ao Codex Vaticanus, guardado na biblioteca do Vaticano. Este, por sua vez, é tão antigo quanto Aleph(também conhecido como Sinaiticus e B'). O ambiente do vaticano, diga-se de passagem não é menos escabroso que o mosteiro de Santa Catarina, mas obviamente estes são detalhes adicionais.
O manuscritos possuíam algo que os diferenciava dos demais: a idade e o local de origem. Enquanto que os manuscritos bizantinos eram oriundos de regiões de Constantinopla, cidade apoiada pela "escola teológica" de Antioquia, Os manuscritos Sinaiticus e Vaticanus eram provenientes de Alexandria, no Egito, sendo esta uma considerável rival de Constantinopla. A idade dos manuscritos bizantinos, extremamente concordantes entre si, é do século V em diante, enquanto que os manuscritos alexandrinos são do século IV (sendo o Vaticanus ligeiramente mais novo que o Sinaiticus e em melhor estado de conservação.
É nesse contexto que surgem a figura de Westcott e Hort. Ambos estudiosos anglicanos. Hort se destaca por um ódio ao Textus Receptus, ao ponto de chama-lo de " Este vil Textus Receptus"**. Tendo com objetivo substituir o Textus Receptus, os dois amigos empreenderam a tarefa de editar um novo texto, utilizando novos tipos de conceitos de crítica textual. O resultado foi o texto crítico da Bíblia, baseado em ambos os manuscritos Alexandrinos. O texto era profundamente distinto do Texto Grego Tradicional do Novo Testamento. Um novo texto surgiu, e conseqüentemente, novas Bíblias viriam. Terá sido essa atitude saudável, afinal, quais eram os pensamentos teológicos de Hort e Westcott? É justa a metodologia da crítica textual? São questões pertinentes que não podem ficar sem respostas, ou pelo menos alguma avaliações.

Continua...

Soli Deo Gloria

* O termo manuscritologia bíblica foi cunhado pelo reverendo presbiteriano Paulo Anglada pois, segundo ele, este termo se adequa melhor do que Crítica textual Bíblica, haja vista que o material da "Crítica" nada mais é do que a Palavra de Deus.

* A frase original pode ser encontarda no livro de Wilbur Pickering, Qual o Texto Original do Novo Testamento? disponível no site Luz Para o Caminho, de Walter Andrade Campelo

7 comentários:

Clebio Lima disse...

A Paz do Senhor!

Muito interessante este estudo, estarei atento à continuidade.

clebiolima.blogspot.com

juberd2008 disse...

Victor,

Interessante a matéria, visto que é sempre bom, dar uma consultada na história para entendermos o que veio até nós. Parabéns pela postagem.

Um abraço fraterno.

Victor Leonardo Barbosa disse...

Olá irmão Clébio, a Paz do Senhor!!! Obrigado pela visita no blog, espero que seja a primeira de muitas. com relação a este tema, se Deus quiser vou escrever as continuações, talvez demore um pouco, pois estou com outros temas para postar. mas que vai sair vai.

Obrigado pela visita e considerações irmão Juber. Com certeza, a história é importantíssima, ainda mais a história dos textos bíblicos.

Abraços e Paz do Senhor!!!

Bruno Oliveira da Silva disse...

Paz do Senhor irmão Victor,
Para mim é uma honra ter o GQL entre os favoritos no PECADOFOBIA. Tenho sido deveras abençoado pelo blog. Parabéns!!!

Em Cristo,
B.O.S
http://pecadofobia.blogspot.com/

Victor Leonardo Barbosa disse...

Obrigado pela visita irmão Bruno, que Deus lhe abençoe grandemente. Mais uma vez o parabenizo pelo blog, que está muito bom.

Obs: vou incluí-lo nos favoritos.

Abraços...

Eribaldo Pereira disse...

Eu creio que o texto Recéptus é a Palavra de Deus, embora tenha um pé atrás quanto a concluir que o mesmo possa ser dito a respeito das traduções. Temos a Palavra perfeita nas cópias existentes do texto recebido, porém eu penso que todas as traduções carecem de aperfeiçoamentos, inclusive aquelas baseadas no texto recebido. Ex: A palavra "inferno" fora usada para traduzir palavras no original como Sheol, Hades, Geena e Tártaros. Sabemos que a palavra "inferno" é uma palavra latina e que não se encontra nos originais preservados nas cópias do texto recebido. Conhecendo esse fatos percebemos o engodo histórico ao qual fomos submetidos quanto a doutrina do inferno. Aí vem aquelas conclusões descabida do tipo: "Jesus" fora quem mais falou a palavra "inferno", verdade? Jesus falava Latim? "inferno" como concebemos hoje tem mais a ver com o sermão puritanista "pecadores nas mãos de um deus irado" Jonathan Edwards do que o ensino sem pré-concepções das Escrituras Sagradas.

Victor Leonardo Barbosa disse...

Olá Eribaldo,

Acho que você tem cometido um certo equívoco desnecessário com relação a expressão latina "inferno", pois ela pode ter os três significados de "geena", "tártaro" ou "Hades", porém nenhum dos três é representado como positivo no Novo Testamento. Dê uma lida no Artigo "O Deus dos Vivos" para saber mais sobre essa questão.

Com relação às traduções, é óbvio que elas não passaram por um processo de inspiração plenário-verbal, por isso, estão sujeitas a equívocos e imperfeições(e até mesmo erros), mas ainda assim podemos chamá-las de Palavra de Deus em nossa língua, pois foi o modo que Paulo e outros apóstolos, por exemplo, trataram a Septuaginta (que era uma tradução imperfeita do texto hebraico). Ou seja, podemos dizer que ela é Palavra de Deus a medida que se conforma o mais acuradamente possível da língua original.